Os Corações São de Quatro Tipos
Louvado seja Allah. Nós Lhe agradecemos e buscamos a Sua ajuda e diretriz. Buscamos refúgio junto a Ele quanto aos malefícios das nossas almas e as maldades das nossas ações. Àquele a quem Allah encaminhar, ninguém o pode desviar, e quanto àquele a quem desviar, ninguém pode pô-lo no caminho certo. Presto testemunho de que não há outra divindade além de Allah, Único, sem parceiros. Presto testemunho de que Mohammad é o Seu servo e mensageiro.
Os corações de todas as pessoas dividem-se em quatro tipos que o Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele), em seu fabuloso hadice, compilado pelo Imam Ahmad, e narrado por Abu Said Al-Khudri, disse: “Os corações são de quatro tipos. Coração puro, com lâmpada florescente; coração coberto e selado; coração abatido e coração blindado.”
Quanto ao puro, é o do crente que possui uma luz. No que diz respeito ao coração coberto, é o do incrédulo. No que tange ao coração abatido, é o do hipócrita que sabe mas nega. Quanto ao coração blindado, é o que tem fé e hipocrisia. A fé que tem nele assemelha-se à erva, alimentada pela água. A hipocrisia dele é como a ferida, alimentada pelo sangue e pelo pús. O que sobrepuja o outro prevalecerá.
É uma divisão extraordinária que o Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) fez dos corações dos humanos, que abrange todos os corações, sem exceção. O hadice fidedigno também nos informa que o Profeta (S) disse: “Há no corpo humano um pedaço de carne; quando este está saudável, todo o corpo fica saudável, e quando está doente, todo o corpo fica doente. É o coração.”
Ele também disse: “Allah não olhará para as vossas figuras e vossos corpos, mas olhará para os vossos corações e para as vossas ações”, porque é o local da intenção. Podem dez pessoas praticar o mesmo ato, mas Allah só irá aceitar quem o fizer para aprazê-Lo.
Por isso, o Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) discorreu sobre os corações, descrevendo o do crente como puro, ou seja, puro de toda espécie de desejos. Ele faz por Allah e para Allah, não se importando em agradar ou desagradar às pessoas. Ele oferece a sua vida pela sua religião, e esse é o objetivo dos que são sinceros para com sua religião. Por isso, seu coração possui uma lâmpada florescente, a lâmpada da fé, e a sua pureza e o sinal de sua sanidade do ilícito. Por isso, Allah descreveu esse coração da seguinte forma: “Salvo para quem comparecer ante Allah com um coração sincero” (26:89), livre de cultuar alguém além de Allah, livre de recorrer a alguém além do Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele). O coração puro é aquele cuja cultuação é inteiramente a Allah. Se ele der algo, o faz em nome de Allah e se o restringir, o faz em nome de Allah. A origem da pureza é a luz que brota do coração do crente e lhe ilumina o mundo, como nos foi informado por Allah: “Pode, acaso, equiparar-se aquele que estava morto e o reanimamos à vida, guiando-o para a luz, para conduzir-se entre as pessoas, àquele que vagueia nas trevas, das quais não poderá sair?” (6:122) E iluminará o seu caminho na Outra Vida, como Allah diz: “O dia em que verás os crentes e as crentes com a luz a se irradiar ante eles, e pelas suas mãos direitas. Nesse dia vos alvissaremos com jardins, abaixo dos quais correm os rios, onde morareis eternamente. Tal será a magnífica recompensa!” (57:12).
Essa é a luz citada pelo Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele), ao dizer “A sua lâmpada será a sua luz.”
Quanto ao coração coberto e selado, é o coração do incrédulo. Ele está hermeticamente fechado, não vê a luz nem a luz o vê. Verificamos isso no detalhe da expressão do Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) quando disse “coberto e selado”. A cobertura sozinha não é suficiente, mas há o selo hermético que o isola da luz da ciência, da fé e da orientação. É o que aconteceu com os judeus a respeito dos quais o Alcorão diz: “E disseram nossos corações estão insensíveis” (2:88)
No que diz respeito ao coração abatido, é o coração do hipócrita que conheceu a verdade e não a seguiu, mas a negou e lutou contra ela. A origem dessa hipocrisia são os corações enfermos, que amam a vida terrena, amam a autoridade, amam as posições e amam os desejos, como foi esclarecido por Allah: “Em seus corações há enfermidade, e Allah os aumentou em enfermidade, e sofrerão um castigo doloroso por suas mentiras… São os que trocaram a orientação pelo extravio; mas tal troca não lhes trouxe proveito, nem foram iluminados.” (2: 10 e 16).
Se o incrédulo se harmoniza consigo próprio porque escolheu a incredulidade como caminho e é sincero quando o faz. O hipócrita não se harmoniza com o mundo cultuador em que vive, nem consigo próprio; ora se joga no colo dos incrédulos ora no dos crentes. Allah cita isso: “E quando se deparam com os crentes, asseveram: Cremos. Porém, quando a sós com os seus sedutores, dizem: Nós estamos convosco; apenas zombamos deles. Mas Allah zombará deles, e os abandonará, vacilantes, em suas transgressões” (2:14-15).
Este é o pior dos corações porque considera o ilícito lícito e segue os seus adeptos, e considera o lícito ilícito e combate os seus adeptos.
Dando continuidade aos tipos dos corações, como foi-nos esclarecido pelo Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele), dissemos que o coração invertido é aquele que conhece a verdade e não a segue, nega-a e a combate. É preciso sabermos que a alma do hipócrita é perturbadora, representando um perigo enorme para a sociedade islâmica por conhecer os seus segredos. Por isso, Allah descreveu-os como: “E quando os vês, os seus aspectos te agradam; e quando falam, escutas-lhes as palavras. Todavia, são como madeira encostada; pensam que qualquer grito é contra eles” (63:4). O hipócrita caracteriza-se por marcas que o apontam. O Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) esclareceu-nos a respeito do hipócrita, dizendo: “O fingido possui três aspectos: quando está só torna-se preguiçoso, quando está com as pessoas, torna-se ativo. Quando é elogiado, trabalha mais. Quando é censurado, trabalha menos.”
Quanto ao coração vacilante é aquele que abriga a fé e a hipocrisia ao mesmo tempo. Ora está do lado dos crentes, ora está do lado dos incrédulos. Esse tipo de hipocrisia é o que representa o maior perigo para o crente, porque ele é considerado crente e, ao mesmo tempo, possui um aspecto de hipocrisia. Lemos, nos dois livros fidedignos do hadice, que Abdullah Ibn Amr Ibn Al ‘As (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) relatou que o Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) disse: “Existem quatro características (para se conhecer a hipocrisia); quem as tiver será um autêntico hipócrita, e quem tiver só uma delas terá a característica de hipocrisia, até que a abandone. Caso se confie nele, trai a confiança; se conta algo, mente, se faz um pacto, viola-o; e se tem alguma diferença com alguém, age com perversidade.”
Se a fé é constituída de setenta e poucas características, a hipocrisia possui muitos aspectos. Abu Huraira (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) relatou que o Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) disse: “Distingue-se o hipócrita por três características: quando conta algo, mente; quando promete, não cumpre; e quando confiam nele, trai, mesmo que jejue, pratique a oração e alegue que é muçulmano.” Devido a esse comentário assustador dos corações crentes, o Bukhári compilou que Ibn Abi Malaquiya narrou: “Conheci trinta dos companheiros de Mohammad (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele). Todos eles temiam que se tornassem hipócritas.” A respeito disso, Allah diz: “O que vos aconteceu, no dia do encontro dos dois grupos, aconteceu com o beneplácito de Allah, para que Ele testasse os verdadeiros crentes; e testasse também os hipócritas, aos quais foi dito: Vinde lutar pela causa de Allah, ou defender-vos. Disseram: Se soubermos que irá haver combate, seguir-vos-íamos! Naquele dia, estavam mais perto da incredulidade do que da fé, porque diziam, com as suas bocas, o que não sentiam os seus corações. Porém, Allah bem sabe tudo quanto ocultam” (3:166-167).
Ibn Taimiya, comentando o assunto, disse: “Alguns estão mais próximos da incredulidade do que da fé por serem confusos e sua incredulidade é maior do que a sua fé, outros a sua fé é maior do que a sua incredulidade.” O Profeta (que a Paz e a Bênção de Deus estejam sobre ele) comparou a fé dos corações e os atos da virtude e das boas obras com a semente que é regada por água pura, que a desenvolve. Ele disse: “A fé assemelha-se à erva, alimentada pela água pura. A hipocrisia é como a ferida, alimentada pelo sangue e pelo pús. O que sobrepuja o outro, prevalecerá.”
As posições mais vergonhosas dos governantes muçulmanos é a sua humilhação e hipocrisia, sem se importarem com a ira de Allah. Narra-se que Fadhl Ibn Rabi’, ministro de Harun Al Rachid, foi ser testemunha num caso perante Abu Youssef, companheiro de Abu Hanifa. Abu Youssef não aceitou o seu testemunho. Fadhl queixou-se ao Califa. Este perguntou Abu Youssef a causa de sua recusa de aceitar o testemunho do homem. Abu Youssef lhe disse: “Ouvi-o, um dia, dizer ao califa: ‘Sou seu escravo!” Se ele disse a verdade, o testemunho do escravo não é aceito. Se mentiu, o seu testemunho, também, não é aceito.”
Ibn ‘Alcami, um outro ministro dos califas abássidas, contatou o comandante dos tártaros e colocou-o à par da situação dos muçulmanos, o número de seus exércitos, o número de seus combatentes, etc. Ao mesmo tempo, arrefeçou os ânimos do califa e o aconselhou a capitular e não entrar em guerra contra os tártaros. Muito depressa, os exércitos de Hulaco invadiram as terras islâmicas, destruindo tudo que encontravam pela frente, matando os muçulmanos. Os historiadores dizem que o número de mortos foi de oitocentos mil a um milhão de vítimas. Isso numa só cidade. Eles pegavam os familiares dos abássidas, juntamente com suas mulheres e filhos e os levavam para o cemitério, degolavam alguns como se degolava carneiros, e aprisionavam outros. Mataram idosos, que sabiam o Alcorão de cor, destruíram as mesquitas e proibiram as reuniões por vários meses, em Baghdad. Tudo isso aconteceu com a comunidade muçulmana, apenas. Nada aconteceu com judeus e cristãos, de acordo com Ibn Kacir.
Isso nos mostra quão maléfico é o hipócrita para a sociedade. Quanta matança e quanta destruição causou Ibn ‘Alcami com a sua hipocrisia! O que ele lucrou, com aquilo? Ele foi nomeado ministro dos tártaros, depois da queda de Baghdad, por alguns meses apenas. Pois, logo morreu, sem desfrutar do prêmio de sua traição.
A situação dos muçulmanos só irá melhorar quando cada um deles estiver disposto a comprazer a Allah e aplicar o sistema d’Ele. “Quanto àqueles que diligenciam por Nossa causa, encaminhá-los-emos pela Nossa senda. Sabei que Allah está com os benfeitores” (29:69).
Que Allah nos fixe na fé e limpe os nossos corações da hipocrisia. Amém.
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