Produzido nos Estados Unidos, o filme anti-islâmico que tem provocado ondas de protestos em países muçulmanos abriu o precedente para uma discussão polêmica: quais são os limites da liberdade de expressão e de religião?
Com a repercussão negativa da fita, outro questionamento também surgiu: em meio ao recuo dos Estados Unidos, que criticaram fortemente seu conteúdo, até que ponto a autocensura e a regulação devem ser impostas de forma a acalmar os ânimos religiosos mais exaltados?
Para responder essas perguntas, a BBC colheu depoimentos de uma série de analistas. Confira.
Eu sou muçulmano e ocidental, mas não considero que os dois elementos se oponham.
Chegamos a um estágio em que não existe mais o controle da Igreja Católica sobre o que pode ou não ser dito ou escrito em público. No passado, os “hereges”, aqueles que não aceitavam a doutrina do catolicismo, eram mortos ao lutar pela liberdade religiosa, de pensamento e de expressão. Considero tais liberdades sacrossantas.
Foi a coragem desses protestantes que permitiu a criação de sociedades seculares e plurais no Ocidente, possibilitando, pela primeira vez na história, que um grande contingente de judeus e muçulmanos morassem juntos e praticassem cada qual sua religião.
A barbaridade dos pogroms, da caça às bruxas e dos hereges sendo queimados vivos em praça pública felizmente acabou.
Os meus colegas muçulmanos precisam entender tal pano de fundo. Não podemos sufocar as diversas liberdades existentes sob a alegação de proteger a nossa religião. É claro que eu me sinto pessoalmente atacado quando o profeta Maomé é insultado.
Inclusive, porque a literatura ocidental, de Shakeaspeare a Thomas Paine, está cheia de referências negativas aos muçulmanos, chamando-os de “mouros”, “turcos” e “seguidores de Maomé”.
Paralelamente, os escritos clássicos árabes e persas estão repletos de antissemitismo e negação à divindade de Cristo como filho de Deus.
Ainda assim, é importante que nós, do Ocidente, tenhamos conseguido acomodar em um mesmo (ou mais) países todas as fés – e inclusive aqueles que não professam nenhuma fé.
Essa evolução não pode ser revertida. A autocensura é uma tentativa de reverter os ganhos realizados pelos intelectuais de outrora, nossos antepassados.
Tão quanto os muçulmanos são livres no Ocidente, os cristãos e seguidores de outras fés precisam ter a mesma liberdade no Oriente.
Nós, muçulmanos, matamos algum dos maiores iluministas por causa de acusações clericais de heresia, motivadas pela ausência da liberdade de pensamento.
Da execução de al-Hallaj em Bagdá, no Iraque, ao apedrejamento de Ibn Arabi em Damasco, na Síria, passando pelo banimento de Bulleh Shahm em Punjab, a história está cheia de exemplos.
Esses muçulmanos são mártires por terem lutado pela liberdade de pensamento.
Como um muçulmano ocidental, eu quero defender essas liberdades e assegurá-las para as futuras gerações.
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Fonte :
Ed Husein é pesquisador sênior de estudos do Oriente Médio do centro de estudos Council on Foreign Relations e autor do livro “The Islamist”
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